Recados da Inês: Mais.

novembro 29, 2017

através de Pequenas Memórias



Eu já tive o cabelo vermelho até meio das costas. Já tive o cabelo curto, como um completo rapaz. Já pintei as pontas de roxo, já o tive completamente preto.
Eu já me vesti apenas de preto. Já usei botas de biqueira de aço e já fui totalmente dependente da pose agressiva.
Eu já fui ameaçada de porrada à conta de expressar que sou conta touradas, já tive discussões acesas devido ao meu desprezo pelo Chagas Freitas enquanto escritor, e já tive pessoas a achar que as minhas opiniões eram demasiado claras.
Eu já fiz tudo isso e em tudo isso uma coisa foi mais que certa: existiu sempre alguém para me tentar fazer sentir tudo aquilo que eu não era mas que, se estivesse menos atenta, eu sentiria que sou. Não obstante, nada disso ficou.
É que as pessoas têm esta mania de nos olhar como imagem estampada ao longe, talvez a fachada de um prédio, quando ainda caminham muito, muito longe desse prédio - olham-nos como se, ao olharem o cabelo vermelho conhecessem o que sou para além do cabelo vermelho. E eu sou tantas coisas!
Interpretam-me os gestos como se fossem gestos finais e não gestos com história - todos os nossos gestos têm uma história. Todas as nossas atitudes estão inseridas num fluxo interminável de causas e consequências e isolar um gesto sem saber das dores do coração e da alma é no mínimo injusto.
Como é que analisamos as pessoas sem conhecer as pessoas? Como é que dizemos delas sem saber quantas vezes elas choraram? Porque é que choraram. Quanto tempo choraram. Como é que assumimos uma pessoa sem fazer ideia dos lutos que já fez, das lutas que já traçou? Das palavras que já foi obrigada a ouvir e das palavras que queria tanto ouvir mas nunca chegaram?
É que, quando queremos interpretar alguém, é isso que importa.
Não é o riso momentâneo - talvez contrariado logo de seguida por um olhar apagado. Não é a mão nervosa. Não é o pé que não pára de bater. Não são as palavras ditas a quem não conhece. É, mas não é só. E não é só é muito mais.
'Não é só' são os finais de noite ainda desperta e meio caminho andado para uma mão amiga. São as medidas de entendimento e de realidade que parecem passar-nos sem que demos conta actualmente.
Não somos apenas fotos numa galeria bem organizada (embora isso possa fazer parte de nós), não somos egos inflados, propagandas enganosas, máquinas em piloto automático.
Somos feitos de pele e a pele rasga. Somos feitos de alma e a alma degrada consoante o lugar onde se encontra, as pessoas por quem se rodeia, o ambiente em que tenta vingar.
E a vida é muito curta para se fingir ser feito de ferro. A vida é demasiado curta para sermos, nos tornarmos apenas naquilo que os outros vêm na fachada sem conhecer a história.

Então eu aceito que tenha tido o cabelo vermelho e mo digam de forma incisiva. Aceito que não concordem comigo quando expresso a minha opinião e consigo até aceitar que me torçam o nariz quando mostro as minhas fotos com o cabelo curto. Curtíssimo. O que não aceito é que me diminuam na minha essência. Que me queiram retirar a coragem e a força que fui conquistando durante a vida toda. Que me digam que não sou quem sou porque sou. E sou ainda mais. E amanhã serei ainda muito mais porque estou aqui para ser sempre melhor do que fui. Para aprender a minha passada determinada todos os dias.
Para amar o silêncio do meu sorriso imperfeito e todo o barulho ensurdecedor que o passado nos deixa nas mãos para trabalhar.
Para trabalhar.
Eu fui sempre mais do que pensaram de mim. Sempre fui.
Não acredito que algum dia deixe de o ser.

                     Aprende-te e reconhece o teu valor.


 Inês, 

        XOXO.      


PS- passem lá no instagram do pequenas memórias, prometo que não se vão arrepender. 

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